sábado, 21 de novembro de 2015

Como a fibromialgia salvou minha vida

Quando recebi o diagnóstico de fibromialgia, eu tive duas opções: ou me entregar a ela e deixar que ela me derrubasse (eu poderia estar aqui me vitimizando, falando o quanto o medicamento que eu uso me faz mal, mas em como é doloroso ficar sem ele e mimimi), ou aprender com ela e fazer com que isso me tornasse uma pessoa melhor, mais forte, mais ativa e mais saudável. Fiquei com a segunda opção. 

O nosso problema sempre é do tamanho que enxergamos. Se você der muita importância a um problema, ele tomará conta de ti. Eu escolhi dar uma banana para a fibromialgia. Esqueça que você tem isso: levante a bunda da cadeira e vá se exercitar! Aposto que, assim como eu, descobrirá uma nova vida. Eu era totalmente sedentária e, mudando apenas esse hábito, todo o resto ao meu redor se transformou... quer saber como? Continue lendo e você ficará impressionado com o poder da atividade física.

Como toda criança, eu era muito ativa. Corria, brincava, subia em árvores, andava de bicicleta, de patins... mas sempre detestei esportes com bola. Cheguei a pegar recuperação em educação física, porque eu tinha trauma de levar boladas na cara. Sempre usei óculos e, se os tirasse para jogar, não enxergava bem. Se ficasse com eles, poderia me machucar. Então, tornei-me avessa a vôlei, basquete, futebol e tudo mais que envolvesse pessoas disputando uma bola. Não quero, com isso, justificar o meu sedentarismo, mas acho que, como não aprendi a apreciar e nunca pratiquei nenhum esporte desse tipo, acabei me tornando uma adulta sedentária, pois me criei em uma cidade muito pequena, que oferecia poucas opções de esporte e lazer.

Como quase todo ser humano, me adaptei bem ao sedentarismo (neste vídeo, o Dráuzio Varella explica por que as pessoas não conseguem praticar atividade física) e fiquei totalmente sedentária por mais da metade da minha vida. Tentei frequentar academia algumas vezes, sem sucesso. Odeio o ambiente de academia, acho musculação um saco e não vejo sentido em esteira e bicicletas ergométricas... me sinto muito ratinho de laboratório quando estou nesses aparelhos. Quando morei em Floripa, tentei praticar natação, mas escolhi um horário com o qual não me adaptei e acabei largando o esporte. 

Quando eu descobri, mais ou menos em abril de 2014, que eu era portadora de fibromialgia (neste outro texto eu explico como foi esse processo), o médico disse que eu teria que tomar antidepressivos ou então praticar atividade física TODOS OS DIAS. Lembro como se fosse hoje: ele me explicou que quanto mais prazer a pessoa sente com a atividade que pratica, mais endorfina o corpo produz, portanto, a eficácia do exercício no combate à dor é diretamente proporcional ao prazer que sentimos com aquela atividade. Nessa hora, pensei: estou ferrada, não gosto de nada! Pela cara que eu fiz, o médico já imaginou que isso seria difícil, então me perguntou: "Você não gosta de academia, né? Mas você deve gostar de alguma coisa... você só não se lembra! O que você gostava de fazer quando era criança?". Lembrei que gostava de patinar... No mês seguinte, comprei um par de patins.

Lembrei que no final de 2013, quando estava de férias em João Pessoa, fiquei encantada com aquela ciclovia na orla da praia de Cabo Branco e vi algumas pessoas patinando, algo que eu não via há muito tempo. Lembrei do quanto eu gostava disso quando era criança e, na época, até falei para o meu ex-marido: "Quando a gente chegar em Foz, vou comprar patins e vou começar a praticar", ele respondeu: "Mas lá não tem lugar adequado para isso!". E é verdade. Não tem mesmo. Então, deixei pra lá e esqueci da ideia. Acontece que, quando queremos (ou quando precisamos - lembrem que, ou era isso, ou os antidepressivos), a gente dá um jeito. Não existe um parque em Foz do Iguaçu com uma pista lisa e plana para patinação, mas a rua onde eu morava tinha acabado de ser pavimentada, então era lá mesmo que eu praticava. Comecei patinando duas vezes por semana, depois aumentei para 3, 4... E fui sentindo, pouco a pouco, uma melhora nas dores. 

Quando o verão chegou, a coisa se complicou um pouco, pois em Foz do Iguaçu é comum fazer 45 graus. Como no horário de verão o sol se põe quase às 21h, muitas vezes a sensação térmica à noite passava dos 35 graus... Algumas vezes, tentei patinar, mas o asfalto estava começando a liberar o calor que passou o dia todo absorvendo. Tornou-se inviável a minha atividade física. Então pensei: "Preciso de uma atividade física indoor!". Comprei um Xbox e comecei a dançar zumba em casa. Por uns três meses funcionou que é uma beleza, depois comecei a ficar de saco cheio. Em janeiro de 2015 procurei uma academia e me matriculei na natação. 
- Patrícia, qual é o teu principal objetivo na natação?
- Praticar atividade física sem sentir calor.
- Hehehe... Sério mesmo? A maioria das pessoas respondem "aprender a nadar" ou "perder peso"...
- Ah, sim! Perder peso seria ótimo também. Mas, pra mim, o principal é manter uma atividade física regular sem sentir os efeitos deste verão lazarento!

Comecei a nadar três vezes por semana. Em fevereiro, comprei uma bicicleta e, nos dias que eu não tinha natação, eu andava de bike, dançava ou patinava, de acordo com o que o clima permitia.
Mas nunca antes, em toda a minha vida, senti tanto prazer com uma atividade física quanto sinto com a natação. Muitas vezes eu saía da academia tão cheia de endorfina, que era tomada por uma sensação de euforia quase que incontrolável. Eu nunca faltava às aulas e meu corpo foi tomando outra forma, passei a gostar mais do que via no espelho e, consequentemente, a gostar e querer cuidar mais de mim e da minha aparência. Como eu estava super disciplinada com a minha atividade física, não queria estragar tudo comendo besteira, passei a cuidar mais da alimentação e comecei uma reeducação alimentar com a ajuda de uma nutricionista. Uma coisa foi levando à outra. Minha autoestima foi melhorando, passei a gostar mais de mim do que de qualquer outra pessoa no mundo, então rompi um relacionamento de 7 anos, que já não estava mais dando certo, e fui morar sozinha, só com meus dois bebês peludos. 

Hoje moro em uma casa um pouco menor, com a Envy e com o Gatão, conheci outras pessoas, tive outros relacionamentos, tenho vizinhos ótimos, que hoje são a minha família aqui em Foz. Tenho um espaço só meu, comprei os móveis que eu queria, da cor que eu queria, do jeito que eu queria. Estou pesquisando modelos de sofás de pallets para a sala e de outros móveis com material reciclável para a área de lazer externa. Hoje, meu maior dilema pessoal é escolher a cor da tinta que vou usar para pintar a madeira dos pallets. Vivo sozinha e me sustento sozinha. Descobri em mim a melhor companhia para mim mesma e, pela primeira vez em 34 anos, fiz uma viagem sozinha. Gostei tanto que, no dia seguinte ao meu retorno, já comprei passagens para a próxima viagem.

O que isso tem a ver com a fibromialgia? Tudo! Se não fosse por ela, eu jamais teria saído do meu sedentarismo, jamais descobriria o quão prazeroso pode ser nadar, pedalar, patinar. Sem isso, eu continuaria vivendo a minha vida sem olhar muito para o espelho e talvez demorasse mais para perceber o quão interessante pode ser uma mulher que saiu cedo da casa dos pais, ralou muito para passar em um concurso público e hoje é dona do seu próprio nariz, só corrigindo os textos das pessoas. A atividade física, além de me livrar das dores da fibromialgia, trouxe minha autoestima de volta, a qual estava meio esquecida em algum lugar dentro de mim, quando aceitei a viver uma vida que não era minha, era de outra pessoa - a quem amei muito e com quem tive a oportunidade de amadurecer demais da conta, mas que não estava mais dando certo como casamento.

Escolhi que, ao invés de comprar duas caixas de antidepressivos, eu pagarei a mensalidade da natação: esse é o meu remédio! Essa é a minha paixão. E, o melhor de tudo: é uma atividade física que poderei praticar a vida toda, pois não existe restrição de idade (ao contrário da bike e dos patins, que, conforme a idade avançar, terei de deixar de lado, devido ao risco de quedas).

O bem-estar que um estilo de vida saudável, uma alimentação balanceada e a prática regular de uma atividade física proporcionam é imensurável. Se você se apaixonar pelo que faz, é fácil manter a disciplina, pois o exercício deixa de ser uma obrigação e passa a ser um prazer. Quando estou na água, é o meu momento, não penso em mais nada e em ninguém, apenas na minha respiração, nos meus batimentos cardíacos, nos meus novos recordes... A mente fica totalmente alheia aos problemas do mundo, vazia, e a sensação de relaxamento que a água proporciona me faz sentir a pessoa mais feliz do mundo. Para mim, é impossível ter depressão nadando! Ao sentir todas essas coisas incríveis eu fui descobrindo uma força interior que eu desconhecia. Bem que dizem que a melhor fase da vida da mulher é após os 30 anos! Me livrei de pensamentos negativos que tinha a respeito dos outros e de mim mesma, percebi que a minha felicidade e o meu bem-estar dependem única e exclusivamente de mim. E uma vez que descobrimos isso, empoderamo-nos, e ninguém, idiota nenhum é capaz de mudar o que sentimos por nós mesmas. 

Fui percebendo que a vida é feita de pequenos momentos felizes e que, uma vez que sabemos quem somos, o que os outros pensam de nós não nos diz respeito. Quando você cuida de si mesmo e da sua saúde, aprende a se amar mais - e esse é o único caso de amor eterno que vale à pena cultivar e acreditar na vida, porque o amor que vem dos outros pode ir embora com eles, mas aquele que vem de dentro de si mesmo é para a vida toda. Isso sem mencionar que "nunca é alto o preço a pagar pelo privilégio de pertencer a si mesmo". 

Obviamente que estar apaixonada é maravilho e estar com alguém pode ser fantástico, mas é preciso ficar atento e sempre praticar aquele "egoísmo saudável": saber gostar de si mesmo mais do que gosta do outro. A atividade física me ensinou isso. A fibromialgia me proporcionou esta vida que tenho hoje. Se hoje eu me vejo com essa clareza, é porque eu fui forçada a mudar. Obrigada, fibromialgia! Você me trouxe dor, mas trouxe também autoconhecimento! Sempre dizia aos meus alunos que não existe sabedoria sem dor, pois a "dor" está dentro da sabedoria. Todo o conhecimento que carregamos são fruto do nosso esforço, da nossa dedicação, às vezes do nosso sofrimento.

Então, um brinde às nossas dores, que nos deram nossa experiência! Um brinde à fibromialgia! Tim-tim!

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